Monday, November 16, 2009

Aprendiz de Cozinheira

Minha primeira experiência culinária aconteceu por volta dos 10 anos, mamãe havia saído corri para a cozinha, cortei duas maças, uma banana nanica em pedacinhos e cobri com toddy e açúcar. Exibi a resultada à noite orgulhosíssima pouco antes do jantar.

Papai experimentou fazendo caretas enquanto o pó do toddy caia sobre o seu queixo. A receita tinha uma aparência horrorosa - Recebi uma ordem: - Não faça mais bagunça na cozinha! Nada estimulante para quem um dia poderia bem podia aprender e se interessar pelo assunto.


Devo reconhecer que a minha primeira tentativa deixou o piso coberto de açúcar e meus cabelos marrons de chocolate e fiz uma bagunça danada na cozinha. Consegui me conter por algum tempo.

Alguns anos depois eu me dediquei às omeletes. Ganhei de Natal um bonequinho “cook” invenção americana - o bonequinho tinha uma frigideirinha fixa à mão e jogava pro alto um ovo (de plástico) que caia na frigideira, era movido à pilha. Senti-me inspirada e lá fui eu para a cozinha tentar fazer as omeletes.


O momento de virá-las sempre era trágico freqüentemente se despedaçavam e nesse caso mudava o cardápio para ovos mexidos.


Na adolescência batia muito papo com a minha mãe na cozinha, enquanto ela preparava as coisas eu ia ajudando, fazia o tempero da salada, mexia algum cozido na panela, botava a mesa...

Foi assim que eu vi as coisas como elas são antes de virarem o que comemos, e foi nessa ocasião também que descobri o talento de mamãe para decorar os pratos. Ela não deixava nada ir para a mesa sem um enfeite que ela criava.

Mas, apesar de achar tudo bonito, naquele momento eu não sentia nenhuma vontade de me envolver – Estava em plena “aborrescência”.

Quando passei a trabalhar fora de casa (na adolescência) e chegava fora dos horários das refeições, para não comer comida fria comia ovo quase todo dia. Ou fritava dois ovos bem moles e misturava com arroz...Ah que delicia! Os médicos americanos ainda não haviam descoberto todos os malefícios da gema de ovo, e eu podia desfrutar a vontade!

Na verdade depois de algumas tentativas fracassadas na cozinha, nunca mais me interessei pelo assunto. Só pus a mão na massa mesmo quando virei mãe, mergulhei nas panelas e nos livros de receitas.



Em minhas primeiras incursões sofri muito. Minha Tia Marlene vivia me passando receitas. O problema é que nem sempre os livros ensinam tudo - Morria de desespero quando lia a frase “sal a gosto”.A mamãe vivia me aconselhando a não experimentar nenhuma receita nova quando viesse visita - Como saber se é bom sem uma cobaia? E apesar dos seus sábios conselhos confesso que uma vez paguei esse mico.

Ainda me lembro quando testei uma massa com molho apimentado de calabresa um prato que minha avó materna preparava tão bem - Aceita mais um pouco? – Nããããããooooo....- gemeu meu convidado, com o suor caindo pela testa e a voz igual a uma lixa. – Massss estáááá´...Uma deliciaaa....


Quando finalmente sentei à mesa para acompanhá-los e experimentei o molho, sugeri que levantássemos imediatamente e fomos para um restaurante ao lado da minha casa.


Escalei montanhas de queijo parmesão, nadei em rios de caldo de galinha, na maionese então é bom nem falar. Cheguei a lixar bolo para arrancar a parte queimada e depois disfarcei cobrindo com creme. Mas aprendi cozinhar e a gostar.


Durante muitos anos, por conta dos filhos pequenos sem poder manter uma empregada todos os dias, a vida girou praticamente em torno do fogão.

Nesta época também aprendi a costurar de memória lembrando os gestos da minha mãe, e vivi muitos momentos de uma felicidade básica, com poucas necessidades.
Cuidei dos meus filhos, da comida as primeiras orientações, coisa de mãe mesmo.
E vieram os tempos em que ir para a cozinha foi ficando raro. Passei a ter outras atividades fora de casa, voltei a estudar, a trabalhar fora de casa e fui ensinando pessoas que cozinhavam em nossa casa que captavam o meu estilo e passavam a cozinhar melhor do que eu. Sempre há uma troca.

Até que anos antes de me mudar para o mato, comecei aprofundar meus conhecimentos culinários e percebi melhor qual era de fato a melhor transformação que ocorria em mim.

Dentro de um cenário totalmente inspirador ia pra cozinha inventar coisas e experimentar novas receitas e aprender o tempo certo para trabalhar com um fogão à lenha que fiz questão de construir.


o contato com a água, o fogo, os alimentos na horta, o ritual do preparo é mágico mesmo... Notei também que em mim ocorreu uma mudança para melhor.

Relaxei, fiquei mais criativa, não tinha medo de experimentar combinações, inventar minhas receitas e experimentar a mistura de todas as ervas que foram propositalmente plantadas a cinco passos do meu fogão.

Não precisava mais da geladeira para conservá-las, era só pegar a quantidade que quisesse sempre fresquinho e perfumado.

Agora eu sei como era mágica a cozinha da minha avó! Da minha mãe! Das minhas tias!
Um dia quando vi meu filho na cozinha tentando fazer sozinho um macarrão com molho de pimenta, lembrei das minhas bananas com toddy da infância.

O macarrão estava intragável! Enquanto ele gaguejava aconselhei otimista:
- Insista, um dia vai dar certo!
Na cozinha e na vida o bom cozinheiro é sempre um aprendiz.